sexta-feira, 14 de abril de 2017

A DELAÇÃO PREMIADA E SEUS ASPÉCTOS JURÍDICOS

A DELAÇÃO PREMIADA E SEUS ASPÉCTOS JURÍDICOS


A origem da delação premiada no Brasil se deu com as Ordenações Filipinas, em seu Livro V o qual tratava da parte criminal, tendo este vigorado de janeiro de 1603 até o ano de 1830, quando fora editado o Código Criminal do Império do Brasil, lei de 16 de dezembro de 1830.

Por meio da Lei 8.072/90, que trata dos crimes hediondos, foi adotado no ordenamento jurídico brasileiro o instituto da delação premiada, cujo objetivo é possibilitar a desarticulação de quadrilhas, bandos e organizações criminosas, facilitando a investigação criminal e evitando a prática de novos crimes por tais grupos.

A Lei 12.850/2013 trouxe uma grande inovação no procedimento de aplicação e benefícios da delação premiada, contudo, temos que o instituto em questão já possuía aplicação nos tempos mais remotos da civilização, uma vez que o Estado sempre fomentou a traição em troca do bem comum. Ainda há de se notar que a delação não esta presente somente no ordenamento jurídico brasileiro, tendo previsão do instituto no direito italiano com a pentiti, no direito americano com a plea bargaining, no direito inglês com a crown witness e no direito alemão com a kronzeugenregelung. No tocante a evolução do instituto, com o passar dos tempos à previsão legal passou a ser mais generosa com o delator, agraciando este com cada vez mais com benefícios de redução de pena e até mesmo a extinção da punibilidade pelo perdão judicial ou o não oferecimento da denúncia nos termos previstos da novatio legis.

Além da citada lei que inaugurou a normativização da delação premiada no Brasil, atualmente o instituto encontra-se previsto em diversos instrumentos legais, dentre os quais: Código Penal (arts. e 159, §4º, e 288, p.u.), Lei do Crime Organizado – nº 9.034/05 (art. 6º), Lei dos Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional – nº 7.492/86 (art. 25, §2º), Lei dos Crimes de Lavagem de Capitais – nº 9.613/88 (art. 1º, §5º), Lei dos Crimes contra a Ordem Tributária e Econômica – nº 8.137/90 (art. 16, p.u.), Lei de Proteção a vítimas e testemunhas – nº 9.807/99 (art. 14), Nova Lei de Drogas – nº 11.343/06 (art. 41), e, mais recentemente, na Lei que trata do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência – nº 12.529/2011 (art. 86).

O instituto da delação premiada ocorre, portanto, quando o indiciado/acusado imputa a autoria do crime a um terceiro, co-autor ou partícipe. E não só isso. Também é possível a sua ocorrência quando o sujeito investigado ou processado, de maneira voluntária, fornece às autoridades informações a respeito das práticas delituosas promovidas pelo grupo criminoso, permitindo a localização da vítima ou a recuperação do produto do crime.

Diz-se indiciado ou acusado o delator em virtude de o instituto da delação poder se dar durante a fase de inquérito policial ou mesmo na fase processual, quando já está em curso a ação penal. Na prática, é mais comum ocorrer na fase inquisitiva, pois é nessa etapa que o delator se faz mais útil, sendo capaz de fornecer ao órgão acusador mais elementos da materialidade e da autoria do crime para consubstanciar a denúncia.

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Também chamada de confissão delatória, a delação se difere da confissão em razão desta se referir à auto-incriminação, enquanto aquela representa a imputação do fato criminoso a terceiros.

Basicamente, a delação premiada se perfaz num acordo entre o Ministério Público e o acusado, onde este recebe uma vantagem em troca das informações que fornecerá ao parquet. Quanto mais informação for dada por aquele que delata, maior será o benefício a ele proporcionado.

Como benefício ao delator temos a substituição, redução ou isenção da pena, ou mesmo o estabelecimento de regime penitenciário menos gravoso, a depender da legislação aplicável ao caso.

Sendo assim, a natureza da delação premiada variará conforme a situação do caso concreto, podendo ser, por exemplo, uma causa de diminuição de pena, incidente na terceira etapa do sistema trifásico de aplicação da pena, ou uma causa extinção da punibilidade, pois pode resultar na concessão do perdão judicial, nos termos do art. 13 da Lei 9.807/99, abaixo transcrito:

Art. 13. Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, conceder o perdão judicial e a conseqüente extinção da punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado:
I - a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa;
II - a localização da vítima com a sua integridade física preservada;
III - a recuperação total ou parcial do produto do crime.
Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso.”


O Programa Federal de Assistência a Vítima e a Testemunhas Ameaçadas foi instituído pela Lei 9.807/99, visando à proteção de acusados ou condenados que prestem efetiva colaboração com a persecução criminal de forma voluntária.

No que tange a delação premiada, os benefícios oriundos deste diploma legal foram um tanto quando inovadores, podendo o delator, não reincidente, ter em seu benefício o perdão judicial com a extinção da punibilidade, conforme dispõe o artigo 13, desde que atendidos os requisitos trazidos pelo texto legal, sendo estes: a) identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa; b) localização da vítima com a sua integridade física preservada; e c) recuperação total ou parcial do produto do crime. Devendo ainda o magistrado analisar as circunstâncias do artigo 59 do Código Penal antes de conceder o benefício.

Impende ressaltar que a doutrina combate impiedosamente o instituto da delação premiada, baseando sua posição em alguns argumentos, em seguida alinhavados.

Em primeiro lugar, a delação premiada conduziria a uma láurea ao comportamento antiético, imoral de denunciar aqueles que, de uma forma ou de outra (não se questiona a licitude do comportamento), foram colegas numa determinada empreitada. Remonta-se a história bíblica de Judas Iscariotes para demonstrar a inadequação do comportamento e que o seu fomento por parte do Estado e da Sociedade seria algo inaceitável.

Referido argumento é baseado na idéia de que o ordenamento jurídico, mormente o penal, deve priorizar soluções jurídicas que velem pela conduta honesta, leal e proba dos agentes envolvidos, mesmo que, para isso, deva-se sacrificar o interesse público na persecução penal.

Outro argumento que deve ser trazido à baila é o de que a aplicação da delação premiada poderia oportunizar uma quebra da isonomia entre aqueles que praticaram o delito. Afinal, tanto o delator quanto o co-autor, ressalvadas circunstâncias pontuais do caso concreto, cometem o mesmo crime, desenvolvem comportamento igualmente reprovável, mas, em virtude de uma ajuda na elucidação dos fatos criminosos, obtém tratamento penal diverso.

Assim, isso redundaria num menoscabo ao princípio da igualdade e, também, à proporcionalidade da pena ao fato criminoso.

Assim, do ponto de vista funcional, é inegável a importância da delação premiada, que, se bem utilizada e regulamentada, traz resultado eficientes e concretos, sobretudo no combate à chamada macrocriminalidade, que é caracterizada pela refinadíssima organização empresarial e estrutural na prática criminosa, caso dos crimes de colarinho branco.

Além disso, a eficiência trazida pela colaboração dos acusados pode aproximar o Estado-juiz da verdade material, que é dogma estruturante de todo o sistema de persecução penal brasileiro, facilitando o papel do Estado de punir adequadamente aqueles que infringiram lei imperativa, na medida exata da reprovabilidade de suas condutas.


Fontes:
  • http://www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11229&revista_caderno=3
  • VALLE, Juliano Keller do. Crítica à Delação Premiada: Uma análise através da teoria do garantismo penal. – São Paulo: Conceito Editorial, 2012.
  • https://jus.com.br/artigos/40461/evolucao-da-delacao-premiada-como-meio-de-persecucao-penal#_ftn29
  • http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=2521
  • GOMES, Luiz Flávio. Crime Organizado: enfoques criminológico, jurídico (Lei 9.034/95 e político–criminal, 2a ed., São Paulo: Ed. RT, 1997, p.167).
  • JESUS, Damásio E. de. Estágio atual da "delação premiada" no Direito Penal brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 854, 4 nov. 2005. Disponível em: . Acesso em: 22 fev. 2012.

sábado, 1 de abril de 2017

DIREITOS IGUAIS PARA DETENTAS POBRES

DIREITOS IGUAIS PARA DETENTAS POBRES 


       A ex-primeira dama do Rio de Janeiro, Adriana Ancelmo, passou a cumprir prisão domiciliar na noite desta quarta-feira (29/03) em seu apartamento, no Leblon, Zona Sul do Rio, beneficiada por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), expedida na sexta-feira (24/03) sob a condição de que a casa não tivesse telefones fixos nem celulares e acesso à internet.

             A ministra do STJ Maria Thereza de Assis Moura autorizou a prisão domiciliar da ex-primeira dama sob a alegação que os dois filhos dela e de Cabral - de 10 e 14 anos - não poderiam ficar privados do convívio com os dois pais ao mesmo tempo, já que o ex-governador também está preso.

                Nesta terça-feira (28/03) o Brasil tomou conhecimento de que a ministra do STJ Maria Theresa de Assis Moura, que deferiu o habeas corpus liberando a ex-primeira dama do Rio de Janeiro da prisão em cárcere, estava em Paris, na França, no momento em que decidiu a questão, medida incomum em outros casos.

            Lembrando que a mulher do ex-governador Sérgio Cabral estava presa na ala feminina do presídio de Bangu 8, no Complexo Penitenciário de Gericinó, na Zona Oeste, desde 17 de dezembro. Adriana responde por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa.

            Cada dia fica mais difícil a crença em nossas instituições, especialmente no Poder Judiciário brasileiro, em sua imparcialidade, em seus bons propósitos, em sua Justiça.

          Diante disso, recorremos à Carta Maior de 1988 e indagamos ao Poder Judiciário brasileiro, o disposto no art. 5°, caput, será exercido para as demais detentas nas mesmas condições?

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade...” (grifo nosso)

 
http://www.bancariosrio.org.br/2013/ultimas-noticias

                  

           Cabe ressaltar que, tal julgamento, abre precedentes para demais situações análogas as da ex- primeira dama, pois a interpretação jurisprudencial (ou judicial) provém dos órgãos do Poder Judiciário e tratam-se de manifestações judiciais sobre um determinado assunto, que explicitam a orientação que os juízes e tribunais vêm dando à norma.
             Nesta ótica, reivindicamos "Direitos iguais para as detentas pobres", não estamos aqui defendendo os crimes ou as criminosas e sim seus direitos como cidadã, que, assim como a ex- primeira dama, possuem direitos segundo a Constituição Federal. Não estamos discutindo também se o crime praticado é de menor ou maior potencial ofensivo, pois entendemos que, neste caso, o possível crime de homicídio, furto ou roubo tem a mesma proporção quando se desvia milhões dos cofres públicos que leva um Estado como o Rio de Janeiro à falência e, com isso, a morte de milhares de cidadãos nos hospitais públicos por falta de atendimento, a morte de sonhos de milhares de jovens das universidades públicas.